Saturday, August 20, 2011

Preparativos iniciais

Não sei muito bem onde estou. Parte de mim já partiu. Apenas me apercebi disto quando entreguei a carta de demissão. Mais do que uma simples carta é uma vida que deixava para trás. A partir desse momento tudo mudou. O meu espírito seguiu o seu caminho enquanto deixou o meu corpo para tratar dos preparativos.

E o primeiro foi sentar-me e começar a planear os pormenores desta viagem. Chegou a altura de decidir. É díficil não nos perdermos nas opções. Por isso a minha primeira decisão foi o de tomar o mínimo de decisões. Quero ir ao sabor do vento e ter a oportunidade de estar perdido. Assim tirando o primeiro percurso, Istambul-Mumbai, tudo será decidido pelo caminho. Tenho uma orientação de quais trilhos quero percorrer, mas não vale a pena ter mais que isso.

De seguida começou a fase das compras. Ou melhor das tentativas de compras. É um longo processo de tomada de decisão. Estou consciente que cada euro que sai é menos alguns metros na minha viagem, por isso há que ser bastante cuidadoso nas minhas escolhas. E é uma transformação interessante. Tendo vivido o boom do consumismo, todo o meu processo mental foi distorcido. O impulso de comprar aparece em cada esquina ou montra.

No entanto, pela primeira vez tenho um travão mental. E esse faz-me perder interesse em cerca de 99% das coisas que vejo. Tudo passa a ganhar um tom de surrealidade e este mundo deixa de fazer sentido. Vejo que muito mudou nas ultimas décadas. Já não compras um produto. Compras um cabaz. O melhor exemplo é o telemóvel, que actualmente é um não-sei-quantos-em-1. Assim, a tua tomada de decisão tornou-se bem mais complexa. Não estranho a opção publicitária de apelar ao consumo pela emoção. Isso torna todo o processo de decisão muito mais fácil.

Resultado desta minha primeira investida: não comprei quase nada. Traduzindo: comprei apenas um item dos que preciso. Gosto sempre de começar pela “casa”. A minha tem 3 compartimentos, alguns anexos e materiais de excelência. Ah, e tem alças. Encontrei-a numa loja de especialidade no Alto dos Moinhos. Daquelas à moda antiga, em que quem por lá trabalha não só percebe da coisa como tem prazer no que faz. Não se compra uma “casa” num daqueles espaços standardizados.

A pessoa que me atendeu disse logo uma marca: deuter. Vimos alguns modelos, mas os meus olhos já se tinham apaixonado por uma. Ainda tentei manter a racionalidade e fui para casa pesquisar na internet. Ou melhor, fui para casa apenas fingir que ia tomar uma decisão ponderada. Óbvio que no dia seguinte já tinha a mochila.

E depois desta febre consumista, apareceram os compromissos “administrativos”. Adivinharam: vistos e vacinas. Começando pelos últimos, foi uma agradável surpresa descobrir que tudo está mais facilitado. Foi mesmo só chegar ao centro de saúde e receber a vacina que se encontrava em atraso, enquanto aguardo pela consulta de viajante. Foi estranho voltar a um sítio onde já passei tantas horas da minha vida. Apesar das inúmeras renovações, ainda encontro os recantos onde tantas vezes brinquei. “Privilégios” de ter uma mãe enfermeira.

Já a história dos vistos não é tão “romântica”. Que gente complicada que gere os países. Bem sei que estou mal habituado na Europa, essa terra sem fronteiras. Não gosto de coisas desnecessárias e, para quem quer apenas visitar países, toda esta burocracia parece uma completa perda de tempo. O que vale é que no final fico com um caderninho cheio de carimbos...