Tuesday, January 31, 2012

História de uma foto: Tiruvannamalai



Procurei o enquadramento perfeito. Queria que vissem o que estava a ver. Mas a escolha não recaiu por esse motivo. Escolhi esta foto pelo momento. Foi especial. Tive que me aventurar para chegar ao rochedo de onde veêm esta paisagem. Sobre mim estava o abrigo dum espinheiro. O sítio tornou-se perfeito para estar. Sentia a brisa que chegava com sabor tropical e ouvia a música da cidade com uma suavidade única. Ao ver tão bela paisagem, tudo parou. E eu fiquei por ali. Naquele segundo sem tempo.

Monday, January 30, 2012

A passagem de ano


Tempo de reflexão e votos - like. Dia de stress – dislike. Festa - like. Forçada - dislike. Esta é a minha relação com a passagem de ano. Sempre a desprezar, sempre a festejar. Em viagem não foi diferente. Durante uma semana batalhei para saber onde estaria a 31 de Dezembro. Até que me cansei. Toda a minha vida considerei-a uma festa sem muito sentido (embora seja bela). Agora que tinha oportunidade de escolher o que fazer, estava uma vez mais a cair na malha da preocupação de fim de ano. Um verdadeiro caso para ser estudado pelos cientistas.

Quando decidi seguir o meu caminho, indiferente ao dia, tive o meu momento de brilhantismo. Conseguia romper o ciclo vicioso desta data. Uma maldição que me perseguiu por 32 anos. Em vez de me preocupar com a passagem de ano, preocupei-me mais com os likes.

O primeiro foi passado à frente do computador a enviar mensagens. Depois, perto das 22 horas, saí do hotel para jantar. Escolhi um perto e que não tivesse programa de fim-de-ano. Queria algo com uma boa panorâmica sobre a cidade. Este era, como muitos outros por aqui, no topo de um prédio.

Encomendei a minha comida e deixei o tempo correr. Pelo meio trocava palavras com outras pessoas que estavam sentadas à minha mesa. Quando dou conta, sou o centro das atenções. Um dos poucos ocidentais naquele local. O ambiente é animado e de festa. Sente-se o crescendo da chegada do último minuto. Quando chega o momento é a festa total. Claro que aqui o momento de festejar começa uns 20 minutos antes da passagem de ano. Assim, festejei dez, entre abraços, risos e votos de bom ano.

Lá fora, o resto da cidade acompanhava-nos. Esta era iluminada pelo fogo de artifício. No meio destes festejos, as quatro torres do templo que furam o céu de Madurai continuavam serenas a observar tanta festa. Deixo-me contaminar pela sua calma e sigo o exemplo. Nas ruas, as pessoas pulam e dançam. Os mais aventureiros, têm na mão fogo-de-artifício com que iluminam a sua dança de celebração e dão um caracter mágico ao momento. Sinto-me feliz, não por ter passado mais um minuto no meu relógio, mas por estar naquele momento, àquela hora, a ver isto acontecer...

Sunday, January 29, 2012

De Munnar a Madurai


E ali estava eu. Sentado na paragem de autocarro de Munnar, a ouvir o meu novo “amigo” indiano. Tentava vender-me uma viagem até à fronteira com Tamil Nadu. Tinha perdido o autocarro, e o próximo só vinha às 13 horas, algo que não me atraia. Enquanto ele dizia o preço espetacular que me oferecia, pensava nas opções que tinha.

A primeira - a “oficial” para o meu “amigo” - era esperar até ao autocarro chegar. Essa viagem era apenas um terço do caminho, e tal significava que, com sorte, chegaria de noite a Madurai.. A segunda opção, era aceitar a viagem de 600 rúpias até à fronteira e continuar por bus o resto do caminho. Mas tinha acordado forreta e provavelmente esta custaria 10 vezes mais que o normal. A terceira opção seria apanhar um taxi até Madurai. Apesar do preço astronómico de 2600 rúpias, esta opção garantia que chegava ainda nesse dia ao meu destino.

Com as opções na cabeça deixava o tempo correr para ser menos “interessante” ao meus novos “amigos” - sim, por esta altura já tinha desperto a atenção de mais pessoas. O tempo cura todos os males, e neste caso todos os interesses. Meia-hora depois, já estava livre para confirmar as minhas opções e saber se o preço dado era o normal. Convém confirmar a informação por várias fontes. Uma verdadeira lição de bom jornalismo. Pelo caminho redespeço-me de Dotan e recebo a dica para apanhar o jeep colectivo que ia para a fronteira.

De volta à paragem, sigo em direcção aos jeeps. Encontro um que está quase a sair. “Onde me sento?” Pergunto para receber a resposta óbvia “aqui”. O “aqui” significa um dos bancos laterais da traseira do jeep, num espaço que parecia não “aguentar” mais uma pessoa. Quanto mais uma com duas mochilas de viagem. Mas neste país existe sempre espaço para mais um e lá se arranja um para mim, as minhas mochilas e uma pessoa mais.

Encolhido, e apenas com a ponta do pé a tocar o chão, lá me instalo. Olho à minha volta e todos os lugares parecem ocupados. Ilusão de principiante. Só porque os 6 lugares à minha frente estão ocupados por 6 pessoas tal não significa que o Jeep esteja cheio. Enquanto olho as pessoas à minha volta, apanho o sorriso de uma criança a admirar este ocidental. Algo que me conforta a alma, e que, por si só, valeria a viagem. Quando arrancamos, somos: um motorista, onze adultos, três crianças e umas quantas mochilas.

A viagem, pelo meio das montanhas, foi passada entre tentativas de não voar para o lugar à minha frente, aguentar o máximo de tempo sem me enjoar e a admirar a bela paisagem por onde passava. Esta era uma lufada de ar fresco na minha atribulada viagem.

Duas horas e muitas curvas depois, eramos sobreviventes. Por fim a fronteira entre estados. Tentávamos recuperar o sentido de orientação para a pequena caminhada até Tamil Nadu. Sorrio. Agora só faltava apanhar o autocarro para Madurai. Pelo menos é o que me tinham dito. Depois de consultar o polícia do posto fronteiriço, descubro que ainda tenho de apanhar um bus até outra localidade e só daí é que posso ir para Madurai. Enquanto aguardo pelo autocarro, reparo na beleza desta aldeia fronteiriça. A sensação é que estamos no fim do mundo à beira de entrar noutro. Pouco mais tem que uma estrada, a fronteira e as lojas de rua. Mas está no meio das montanhas e tem uma vista ampla sobre tudo à sua volta.

Ouço o nome da localidade para onde quero ir e o condutor dá-me indicações para entrar. É um taxi colectivo. Aceito o preço e entro no Embassador, um clássico. Apesar da lotação indiana, com o conforto e espaço que tenho, pareço estar numa limusine. Maneira perfeita de me despedir destas belas montanhas. À minha frente vejo a planície cheia de arrozais e palmeiras. Cenário que me acompanhará nos próximos dias.

Chegamos finalmente ao terminal de autocarros. A natureza é agora uma recordação. A substituir tenho a companhia do movimento e barulho desta pequena cidade indiana. Depois de algumas perguntas, encontro finalmente o autocarro. Entro e aguardo que chegue ao destino final. Pelo caminho, tempo para saborear o descanso e uma paisagem tão diferente da que tinha abandonado.

Thursday, January 26, 2012

Um sítio chamado Munnar


Abre o livro da selva. Agora liga a televisão e coloca o filme “Musica no Coração”. Tenta junta-los no mesmo momento e consegues obter uma pequena ideia da paisagem que constitui Munnar. Munnar é para lá de belo. Munnar é Munnar. E é também India. Depois de ter passado quase um mês no Sul da India, pensava que já tinha ficado com uma ideia da região. E como estava enganado. Desde a primeira vez que vi estas montanhas, até ao momento que me despedi delas, o meu queixo não largou o chão.

A pé

Existe pouco para escrever sobre esta zona. A atração é a natureza, constituida de montanhas elevadas. Atinge-se a aldeia de Munnar pelas pequenas estradas que cortam as encostas inclinadas e por vezes nos ilude a pensar que estamos a voar. Aqui o verde impera. Primeiro, na floresta tropical e depois nas plantações de chá.

Acabei por ver esta região de duas formas. A primeira foi a pé. Decidi no primeiro dia, seguir o caminho que me trouxe a Munnar. É um ritmo lento que permite degustar as montanhas e as suas nuvens. Contemplar as encostas aveludadas pelas plantas de chá. Ou simplesmente estar em cima de uma pedra em meditação. É um caminho solitário, mas propenso a detalhes. E também é um caminho arriscado. A estrada é demasiada estreita para caberem dois carro. Uma pessoa está sempre a mais neste conjunto. E nem a opção de qual lado seguir é fácil. De um lado posso ficar espalmado contra uma parede de rocha que se eleva a mais de 100 metros. Do outro, o declive faz-me rezar que os filmes de Tarzan não tenham sido vistos em vão.

Esta tour é boa para estarmos connosco. Deixar os pensamentos fluirem, enquanto nos distraímos com a paisagem. Sentimos uma calma difícil de atingir noutros locais. E quando terminamos a caminhada a olhar para uma cascata perdida no meio da natureza, não conseguimos deixar de sorrir.

Em Tour

Outra forma de fazeres esta região é em tour. E se o tempo limitado para ver cada local te pode afastar desta opção, a oportunidade de conhecer outros viajantes é imperdível. E não sei o que é, mas certos locais parecem ser imans para boas pessoas. Já tinha acontecido em Goa e Hampi, voltou a acontecer em Munnar. Acabei por passar o dia na companhia de três pessoas especiais. Dotan, israelita, músico e simpático. Dani, espanhol e muito divertido. Nadeshwari, do Sri lanka, multi-artista e muito interessante.

E com o “passar o dia”, quero dizer passear-me por um pequeno, mas belo, jardim de flores. Ver os lagos criados pelas barragens. Significa visitar mais uma plantação de chá ou passar o jantar a aprender a comer com as mãos. E terminar a noite a ver uma peça de teatro tradicional e um espetaculo de artes marciais indianas. Foi sem dúvida um dia muito especial. Mais um daqueles momentos que guardo como muito carinho.

E quando saí de Munnar, mais um pedaço de mim ficou por lá. Aquele sitio é mágico. Sei que um dia voltarei lá, é impossível não retornar....

Wednesday, January 25, 2012

Le Moi Errant: Ontem, hoje e amanhã


Ontem era feliz, mas algo dentro de mim não me deixava em paz. Um algo que não conseguia agarrar. Um suspiro nos momentos de felicidade. Um silêncio ensurdecedor nos outros. Suei, aprendi e vivi. Sonhei e realizei esses sonhos. Mais que tudo sorri. Tudo foi dificil. Tudo foi conquista. Andei por ruas escuras. Bati com a cabeça na parede até não sentir mais dor. Puxei o meu limite e encontrei-o.

Hoje é diferente. Rompo a barreira do tempo e do espaço. Encontro novas dimensões na minha existência. Uma construção de muitas realidades. Um olhar diferente. Ando por espaços indefinidos. Por locais inexistentes. Hoje encontro o que ontem não soube descrever. E no meio deste turbilhão continuo a sorrir.

Amanhã já não existirá. Apaga-lo-ei da minha vida. Desaparecerá sem deixar marca. Finalmente soltar-se-á e irá para o seu local, para o amanhã...

Tuesday, January 24, 2012

História de uma foto: Para o céu...


Estava na India, mas não totalmente. O espaço à minha volta parecia ter uma geografia própria e comum a muitos sítios. O lago, os eucaliptos e o verde das montanhas faziam tanto sentido ali, como nos Alpes. E quando olhei para cima, o tempo fundiu-se. Estava no presente e numas décadas atrás. Nessa altura era alguns centimetros mais pequeno, mas os eucaliptos também pareciam enormes como estes. À minha volta, tanto no passado como no presente, uma brisa suave tocava o meu rosto e o som doce do piquenique chegava aos meus ouvidos.

E por breves segundos, o momento congelou-se em muitos momentos e geografias diferentes. Estava sozinho. Entre duas boas conversas, um tecto de eucaliptos e um sorriso interior. Passeie-me lentamente pelos pormenores à minha volta. Pelos sorrisos, descansos, e vozes familiares. Nesse momento pertenci a vários tempos e locais. E quando regressei lentamente à copa dos eucaliptos, e ao raio de sol que tocava o meu rosto, pensei como a natureza é bela e mágica.

Monday, January 23, 2012

A caminho de Munnar


Com as indicações de Firoz memorizadas segui em direcção à primeira paragem de autocarro. Tive de pedir ajuda. Deveria ser ali perto, mas não conseguia encontrar o local. “É já ali” responde-me um vendedor de uma mini-mercearia. E mal aponta, vejo o autocarro a passar por mim. Uma breve corrida e chego a tempo. Digo, perguntando, o meu destino para saber se é o autocarro correcto. O ondular da cabeça do revisor confirma-me que sim. Pelo caminho despeço-me de Forte Cochin.

Saio na paragem que o revisor me indica, mas não encontro o terminal. Saltando de pessoa em pessoa com a minha pergunta: “onde é o terminal?”, sigo uma rua estreita que me direciona ao meu destino. Agora só preciso de encontrar o bus correcto. No meio da confusão, lá me indicam o autocarro. Não é muito atrativo de se olhar, mas uma vez lá dentro nem parece tão desconfortável. Não existem vidros nas janelas, o que permite o ar entrar e observarmos à vontade a paisagem. E se o sol incomodar muito, basta retirar duas patilhas e os estoros descem pela força da gravidade.

O bus arranca assim que fica cheio. Eu tenho um sorriso rasgado. Nem quero acreditar. Vou fazer a primeira viagem num autocarro destes. Preparo-me para o melhor, e principalmente, para o pior.

Sigo por alguns locais citadinos, até atingir as montanhas. Poucas são as palavras para fazer justiça a este caminho. Uma pequena estrada serpenteia as colinas escarpadas das montanhas. À minha volta a selva engole quase tudo, e apenas vejo verde. Não consigo deixar de sorrir. Nem a paragem de 20 minutos, para que um autocarro e um carro consigam cruzar uma curva, me afecta. Como me poderia preocupar quando pareço estar no eden?


O resto da viagem foi um espanto. E o sorriso manteve-se até chegar a Munnar. Uma aldeia no meio das montanhas. Pergunta aqui, corrida de rickshaw ali, lá cheguei à porta da guesthouse combinada. “Não temos quartos” Diz-me ele sem adiantar mais nada. “Sim, mas o Firoz disse-me que me conseguiria arranjar sitio para ficar, mesmo que não fosse aqui” respondo-lhe, já a sentir o nervoso miudinho de quem está a duas horas de perder o Sol e não tem sitio para dormir. “Aqui na rua está tudo esgotado”. Percebo que não adianta ficar aqui, pelo que sigo para a casa de turismo que tinha visto pelo caminho.

Lá dentro três pessoas decidem divertidamente qual a tour que querem fazer. A sua boa onda acalma-me um pouco. Com a decisão da tour tomada, lá consigo explicar o meu caso à pessoa atrás do balcão. Ela diz que acha que tudo está esgotado e sugere que tente um pouco mais à frente, numa das guesthouses existentes. Entretanto outro viajante, que ouvia a minha conversa, dá-me a dica de um hotel que ainda tinha quartos. Peço à empregada do posto para ligar para lá. Enquanto o telefonema vai ocorrendo, a dica multiplica-se por mais três viajantes que estão na mesma situação que a minha.

E lá vamos juntos, ansiosos por saber se existem quartos para todos nós. Acabamos por descobrir que sim. Ninguem iria dormir na rua essa noite. E quando cheguei àquele pequeno quarto de hotel, tudo me parecia perfeito. Dentro de mim crescia um sentimento de que Munnar iria ser especial na minha viagem...

Sunday, January 22, 2012

Mais que uma simples casa: Adam's Guesthouse


Existem casas. Existem sitios para dormir. E depois existe a Adam's Guesthouse. Mais que uma simples Guesthouse, esta é a casa e o negócio de Firoz e sua familia. Quando cheguei a Cochin trazia uma mala cheia de dúvidas. Estava um pouco perdido na minha viagem. Precisava de planear, ao mesmo tempo que visitava a cidade. E logo no pequeno-almoço caseiro, resolveu-me todos os problemas.

Mas não era apenas a ajuda de Firoz que o faz ser especial. Ele é um verdadeiro anfitrião. Mais do que um cliente, nós sentimo-nos parte da familia. E ele faz tudo para que a nossa viagem corra bem. Quando lhe dei a tarefa impossível de arranjar mais uma noite para dormir em Cochin, ele tornou-a possível. Arranjando uma cama alternativa para poder pernoitar. E como o destino achou essa solução demasiado fácil, mandou um hospede incomodado com o lugar dessa cama. Mas Firoz apenas sorriu no rosto do destino, e disponibilizou o quarto dos filhos para poder dormir essa noite.

É dificil transmitir a hospitalidade, a ajuda ou a simpatia de Firoz. Foi ali que comecei a segunda etapa desta viagem. Ele deu-me o empurrão para poder aproveitar ao máximo o que os próximos dias me tinham para dar.

Thursday, January 19, 2012

Crónica: Apaixonado em Cochin


Foi paixão à primeira vista. Mesmo de madrugada Cochin tinha um charme que me conquistava. Mal conseguia esperar por ver este local. Um istmo em forma de ilha. Queria saborea-lo com a luz solar e um corpo rejuvenecido por uma noite bem dormida.

Mantacherry

Pela rua que nos leva ao bairro judeu, sentimo-nos numa aldeia. As casas, quase todas vivendas de um andar ou moradias térreas, guardam o sabor colonial. Foi um terra ocupada por portugueses e holandeses que deixaram as suas marcas. Tal como em Goa, tudo isto é fundido pela cultura indiana. Casas coloniais, igrejas e templos hindus convivem lado a lado. Tudo em harmonia, como apenas a India consegue dar.

O bairro judeu é uma zona comercial, com ruas estreitas. Guarda, mais que qualquer outro local, uma intemporalidade. Os comerciantes chamam-nos para a sua loja, sempre com a promessa de “no harrassement”. Convite que acabo por negar. Não estou em compras e prefiro fazer apenas window shopping. Encontramos lojas de antiguidades, de especiarias ou de tecidos. Os carros passam aqui e ali, mas o movimento é quase todo pedonal. Acabo por chegar à pequena sinagoga para a encontrar fechada.

Sigo então para o meu próximo destino: o Palácio Holandês. Na realidade o edificio foi construído pelos portugueses e oferecido ao Raja de Cochin. Mais tarde, no sec. XVII, os holandeses renovaram-no, e ele adoptou este nome. “Algo injusto” penso enquanto me passeio por este belo local. A casa é de madeira, e os seus salões têm a mesma sensaçao doce de abandono que toda a cidade guarda.

Fort Cochin

Parto do palácio para chegar à zona do Forte Cochin. Pelo caminho atravesso a Bazaar Rd. E como se aprende, o nome Bazaar é equivalente a uma saudável mistura de confusão e comércio. Pela rua estreita passam muitas pessoas e viaturas. Dois camiões parecem conseguir alargar a estrada para conseguirem seguir os seus caminhos. Antigos armazens, são hoje lojas, mercados de especiarias ou sede do partido comunista. Um dos pontos mais interessantes deste estado é que ele deve ser o único caso de sucesso de um Partido Comunista. Foi em Kerala que pela primeira vez um Partido Comunista foi eleito democraticamente. E ainda hoje mantém o poder. Com uma taxa de sucesso assinalável. Desta forma não é de estranhar que encontramos a foice e o martelo um pouco por todo o lado.
Chego à zona do forte cochin, pela área das redes de pesca chinesa. Esta é uma estrutura de madeira que mergulha uma rede de pesca no mar. A zona é um belo postal e combina a atracção turista com o trabalho diário. Não se percebe se os pescadores são modelos para as nossas fotografias estilizadas, ou se conseguem obter o seu proveito desta tarefa - que ocupa cerca de seis pessoas por estrutura.

Daqui parte uma pequeno passeio que acompanha a costa. Pelo caminho, temos as barracas de comidas e artesanato, os amigos que decidem passar um momento a contemplar o mar ou então pedaços do forte que dá nome a esta zona. Mais à frente chegamos à pequena praia, onde indianos aproveitam o calor para dar um mergulho no mar. Retorno a casa por outro caminho que me leva à Basilica e Igreja de S. Francisco. Dois sítios que atestam o passado colonial deste local.

Backwaters

Acabo por chegar às Backwaters através de uma tour que sai de Cochin. E mal podia esperar por vê-las. É um dos grandes highlights desta zona. Cada fotografia ou descrição aumentava a minha expectativa. E todas se confirmam. As backwaters são um pequeno paraíso na terra. Esta zona alagada, com pequenas ilhas que ladeiam os canais dão-nos um cenário idílico. O passeio de barco é algo obrigatório (uma obrigação que não custa cumprir). A manhã foi passada na zona do lago. O nosso guia leva-nos a uma fábrica abandonada. Informa-nos como a vida é em algumas ilhas onde não existe água potável, ou como os barcos são o equivalente aos nossos carros por aquela zona.

À nossa volta outros turistas, alguns pescadores de mexilhões e os passáros compõe o postal em que vivemos. À tarde, vamos para a parte dos canais mais estreitos. Estes, criados pelo homem, atravessam várias casas, e podemos ver um pouco do quotidiano desta comunidade. Quer seja a sesta, o tecer de cordas, ou o arar dos terrenos, tudo é um delicioso pormenor. Na memória fica o silêncio ruidoso da selva. Estamos no meio da Natureza, e ela canta para nós.

Uma paixão torna-nos parcial. E nesta zona não existiu nada que eu pudesse dizer que era negativo. Tudo me pareceu belo e encantador. Tal como sempre parece a uns olhos apaixonados.

Wednesday, January 18, 2012

Le Moi Errant: Solidão


Mesmo antes de partir era algo que despertava a atenção de toda a gente. Talvez seja o que as pessoas mais temem. Mas é algo marcante. Como o é na vida. Muitas vezes tentamos fugir deste sentimento. Mas, como qualquer outro, é importante.

Não escolhes os momentos. Numa altura podes estar com muita gente, e noutra estar no meio duma cidade desconhecida, completamente sozinho. É a naturalidade com que partilhas estes momentos determinam a experiência. E o que é assustador também é uma excelente oportunidade para estares contigo. Algo que tendemos a desvalorizar.

Poucas foram as vezes que senti solidão. O mundo do viajante não ficou de fora do seculo XXI e hoje é muito mais fácil comunicar. Para além disso, raras são as vezes que estás só. Abres-te ao mundo e fazes amizades, conversas espontâneas ou momentos partilhados.

O mais díficil foi o do Natal. São momentos em que a “casa” faz mais sentido. Foi uma experiência marcante. Mas o Natal é mais um dia. E o importante não é o dia em si, mas aproveitares as oportunidades que te são dadas ao longo da vida. Julgo que seja esse o papel da solidão numa viagem. Se passares o desconforto superficial, acabas por aproveitar muito mais tudo à tua volta.

Tuesday, January 17, 2012

História de uma foto: Cochin: a rapariga (...ou uma relação como outra qualquer)


Nunca te cheguei a conhecer. Não realmente. Estavas focada no teu trabalho. E eu demasiado ausente da tua realidade. Nada à tua volta existia. Nem as pessoas que se passeavam, nem as que trabalhavam para ganhar mais um dia de salário. O que te fazia sorrir era o teu trabalho.

Nunca te cheguei a conhecer. Não realmente. Mas essa era a nossa relação. Eu admirava-te e tu eras admirada. Inconsciente deste meu acto. Ainda tive o impulso para mudar a situação. Tão rápido como apareceu também o neguei. Não fazia sentido. Eramos de mundos diferentes. Muito diferentes. Nunca nos iriamos compreender. E a beleza estava na nossa ausência. Fazê-lo de outra forma apenas destruiria o momento.

Nunca te cheguei a conhecer. Não realmente. E como tantos outros, separamo-nos sem os nossos mundos se cruzarem. Apenas partilhamos um breve momento.Tu continuaste concentrada no teu trabalho e eu admirar outras pessoas...

Monday, January 16, 2012

Um Natal diferente


O dia foi passado como outro qualquer. Tinha acabado de chegar a Cochin e a vontade era a de conhecer o sitio que me tinha encantado de madrugada. Apenas umas estrelas, e um ou outra árvore enfeitada, recordavam-me da véspera de Natal.

Com o passar do tempo comecei a ficar mais ansioso. O mais importante desse dia não era o sightseeing, mas a existência de ligação à internet. De volta a casa, esta era a minha prioridade. Já não me recordava que estava em Cochin, mas sim na véspera de Natal.

É estranho estar tão longe e numa vida tão diferente neste dia. Existe uma sensação ambígua. Feliz pelo que atingi, saudoso do que tenho em “casa”. Foi o dia em que tive mais saudades. Tudo me fazia recordar os momentos que se vivem pelo Natal, e como preciosos eles são. Sei que é mais um dia. Mas por esta altura a intensidade é diferente. Os olhos das pessoas carregam outra força. Sentia falta disso.

Mas a fome falou mais alto e, com a ligação garantida, fui para a minha consoada de Natal: um fried rice com masala. Uma forma original de consoar no Natal. O restaurante, que tinha aberto à pouco tempo, estava quase vazio. Apenas mais um casal constituia o grupo de clientes. Eles, de partida, desejam um feliz natal, que retribuo. Com a barriga satisfeita, retorno ao meu quarto.

Ligação online e recebo o meu presente. Duas horas a falar com a minha família. Vejo a minha sobrinha a abrir o presente que lhe ofereci. Algo que é possível quando se tem um bom contato com o Pai Natal. O tempo passa entre histórias, sorrisos e votos de Bom Natal. Pode não parecer muito, mas aquelas horas valeram ouro. Fizeram o meu Natal ser diferente e muito, muito especial...

Sunday, January 15, 2012

Cochin: Outra Portugalidade


Não gostava. Normalmente quando a palavra “construção colonial” aparecia no descritivo, eu não me interessava. Na India mudei de opinião. Tudo começou em Goa, mas confirmou-se em Cochin. Por aqui encontramos os pequenos toques que constituem uma recordação de um passado que também foi português.

O que me atrai não é tanto essa lembrança. Gosto de sentir a fusão. Uma prova que a humanidade é feita de misturas. E que essas, têm o condão de criar algo único e belo. Mais do que encontrarmos um pequeno Portugal, encontramos outra dimensão de Portugalidade, Uma de adaptação e fusão. Sentimo-nos em casa, sem ser a nossa...

Thursday, January 12, 2012

Mysore


Bengalore é a capital actual. Mysore é a capital histórica. Não conseguimos ver uma sem procurar a outra. São complementos necessários para entendermos esta região. Tenho de admitir que acabei por não ver muito, mas o que vi foi o suficiente para encher o olho.

Maharaja's Palace & Devaraja Market

Existem palácios, e depois existe o palácio do Maharajá. Sempre nos habituamos a associar esta palavra a luxo. Aqui percebemos porquê. O sitio é uma amplo espaço que ocupa uma parte da cidade. Do lado de fora nem nos apercebemos, mas uma vez lá dentro encontramos algo que nos mima os olhos. O jardim é amplo e geométrico. Os portões constituem uma janela para a cidade. Em cada um destes, estão os templos que dão aquele toque exótico ao espaço.
Mas a atracção é o palácio. E este é simplesmente belo. As portas de madeira, o chão em mosaico ou as colunas coloridas do salão, transportam-nos para uma outra era. Podemos deixar a nossa imaginação correr livre que ela encontrá sempre um recanto para se aninhar. De saída o jardim parece ainda mais grandioso.
E quando entramos na rua, deixamos esta realidade para trás. Já imperam as buzinas e a confusão. O corre-corre indiano compõe esta cidade e seguimos por ela até chegar ao Devaraja Market. Um mercado constítuido essencialmente por produtos alimentares e flores. Mas suficiente movimentado, para seguirmos a multidão e experimentar um ou outro produto. Gosto de reparar como as pessoas se movimentam. Como os vendedores tentam angariar clientes, ou simplesmente esperam que o seu karma se concretize. É sempre bom o tempo passado no mercado.


Chamundi Hill

E a observar toda esta cidade está a colina Chamundi. É um lugar sagrado e no seu topo estão alguns templos. Sigo para lá de rickshaw, contemplando o espaço verde à minha volta. Chegado ao topo, é o mercado de rua, com as suas bancas e flores que me contagia. Dou uma volta para apanhar a atmosfera do local e reparo em Ganesha uma vez mais.

Decido descer a pé, pela escadaria que os peregrinos fazem para chegar ao topo. A este ritmo consigo apreciar melhor a bela vista que esta colina tem sobre a cidade. Não sou o único. Aqui e ali, as pessoas aproveitam os bancos naturais que as rochas proporcionam. A descida é inclinada e rápida. Pelo meio ainda encontro a estátua de 5 metros de Nandi. Parece ter um sorriso trocista que me seduz.

Mysore tem tudo o que imaginamos duma cidade no Sul da India. É um bom local perfeito para parar e recuperar o nosso folgo. E foi isso mesmo que fiz...

Wednesday, January 11, 2012

Le Moi Errant: Um viajante em construção


Ainda estou em construção. Estes últimos meses foram de intensa aprendizagem. O ritmo foi alucinante, tanto como uma viagem como pode ser. Os dias parecem meses, e os meses, anos. E muito mudou.

Quando comecei tinha de ter tudo muito certo. Os hotéis e as viagens marcadas para poder não me preocupar. O conforto era aquilo que mais valorizava. Não tanto o material, mas o do previsto. Aquela certeza que gostamos de ter quando vivemos a nossa vida.

Mas aos poucos isso é substituido pela incerteza de viver. E com o tempo, tens de fazer escolhas. E são essas que te moldam e te constroem. Quando algo corria mal, poderia tentar resolver e seguir a minha viagem. Ou ficar preocupado e tentar planear tudo melhor e mais certo para a próxima vez. Julgo que é fácil descobrir qual foi a escolha que tomei.

E não é melhor nem pior, mas apenas minha. Na realidade nem cheguei a escolher. Quem eu sou já estava definido e far-me-ia escolher sempre essa opção. As escolhas, mais do que determinarem quem nós somos, constroem-nos para realizar o potencial que já temos dentro de nós.

Esta viagem será sempre uma enorme construção. Ainda tenho muito para aprender, muito para escolher e muito para receber. Por agora, vou andando. Um passo de cada vez. Sempre curioso para saber o que o caminho tem para me oferecer.

Tuesday, January 10, 2012

História de uma Foto: Mysore - os teus pés



Foi um dos pormenores que mais gostei. A relação que as pessoas têm com os seus pés é muito diferente da nossa. Torna-se óbvio pelo andar descalço. E belo pela forma como as indianas decoram os seus pés. Não é só as unhas pintadas ou as pulseiras. É também o anel que utilizam. Elevando o pé à categoria de uma mão. E para mim, isso é lindo.

Para tirar esta fotografia, sentei-me no passeio perto do Palácio do Maharaja. Tinha uma máquina nova com um bom zoom e isso permitia-me arriscar uma foto há muito aguardada. Tive de tirar algumas até conseguir esta. Os pés fugiam demasiado rápido. E a minha timidez não ajudava. Muitas vezes cria um conflito entre a minha vontade de fotografar e o respeito em não o fazer. Desta vez ganhou a vontade. Afinal algo tão belo deve ser partilhado com o mundo...

Monday, January 9, 2012

A pausa em Mysore


Foram dois meses intensos. E sem me aperceber a minha mente precisava de uma pausa. Um tempo sem fazer nada. Ainda não tinha experimentado essa sensação. Acabou por acontecer em Mysore. Nos primeiros dias ainda seguia a minha rotina. Mas sentia que não estava a sentir a cidade da mesma forma.

Intrigado com a situação, procurei dentro de mim a resposta. Só aí é que reparei, estava a precisar de parar. Sentia que estava a chegar ao limite de uma etapa. Antes de passar à próxima, tinha de ter este momento. Refletir um pouco, relembrar as experiências que tive, e acima de tudo, deixar o meu espírito repousar um pouco. Mysore ficará não pelos seus belos sitios, mas sim por ter representado uma mudança de etapa na minha viagem. E isso é das coisas mais importantes que posso ter recebido de uma cidade.

Sunday, January 8, 2012

O livro que me escolheu


Ainda faltavam umas horas para o filme. Sem nada que fazer, fui descobrir que lojas tinha este centro comercial. Depois de passar pelas roupas, perfumes, cafés e restaurantes, aí estava ela. Uma pequena livraria, com pouco mais de 3 colunas de livros. Os livros partilhavam o espaço com DVD's e jogos infantis. Ainda perdi algum tempo para ver que histórias se contam aqui.

Mas era um livro que procurava. Não um especifico, apenas um livro. Uma história para ocupar o meu tempo. E estava difícil. Aquele que eu ando à procura, foge de mim. E procurar um livro sem ter nada em mente, torna-se uma tarefa complicada. Lá andei para trás e para a frente. De vez em quando tinha a certeza que era aquele. Mas algo dentro de mim acabava sempre por me dizer: não. Percorri todas as prateleiras até que um pequeno livro sorriu para mim.

O seu nome era Siddhartha, escrito por Hermann Hesse. Agora, a voz que tinha recusado todos os outros livros dizia para levar este. Contente com a escolha, saí da pequena livraria e fui até à rua. Sentei-me num banco e comecei a ler. Á minha volta, as buzinas dos carros, as pessoas que apressadamente se deslocavam daqui para ali e os condutor de rickshaw estavam agora fora do meu mundo. Eu tinha imerso no mundo de Siddhartha. Um mundo estranhamente parecido ao meu.

Ouvi em tempos que não somos nós que escolhemos um livro. É o livro que nos escolhe. E este escolheu-me na altura perfeita. Tal como Siddhartha, também tinha partido numa viagem. Também estava na India. Também procurava algo indefinido. Poucas vezes uma história me tocou tanto como esta. Eu não li este livro, conversei com ele. Siddhartha transformou-se num companheiro de viagem. Partilhámos momentos. E depois, cada um seguiu o seu caminho. Ele, para as mãos de uma pessoa em Cochin, eu para as do meu destino.

Thursday, January 5, 2012

Bengalorizado


Existem locais que nos atraem por nenhuma razão aparente. Sem ser o título de Silicon Valley Indiano, não encontrava outro grande motivo para estar aqui. Ouvi dizer que esta cidade nos bengalorizava, mas nunca encontrei a definição de tal coisa. Assim fui conhecer a cidade, aberto a tudo o que tivesse para dar...

Mg Road e Cubbon Park

Todas as cidades são marcadas pelas suas avenidas. São sitios amplos que desbloqueiam o movimento dos seus habitantes. Umas são importantes pelo seu comércio, outras pela sua beleza e algumas pela importância que têm na centralidade de uma cidade. Eu diria que a Mahatma Ghandi Road (ou MG Road como é conhecida) é o ultimo caso. Mais do que o comércio ou beleza, é a sua centralidade que a marca. Aqui todas as ruas parecem ir ter à MG Road, e o trânsito - em modo stand still à hora de ponta - é testemunho disso mesmo. Nas laterais desta avenida estão grande empresas, ruas comerciais e hotéis. No seu centro, a linha de metropolitano, posicionada uns bons metros acima do solo. E é por esta avenida que vamos ter... bem a qualquer lado.
No meu caso quis ir ter a Cubbon Park. Um parque plantado no meio da cidade e que contrasta com a agitação da capital do Estado de Karnakata. Aqui, quase perdemos a noção de estar na India. Não existe muito trânsito, as ruas fluem direitas e o verde das árvores dão uma tranquilidade impossível de atingir no turbilhão da típica rua indiana. Vê-se aqui e ali, o casal de namorados a passear, o idoso a reflectir ou o esquilo a pular de ramo em ramo. Claro que o tipo de árvores, e fauna que voa por ali, te diz que estás na India, mas a estátua da Rainha Vitória quase que te transporta para uma outra localidade e tempo. É um bom local para descansares e aproveitares para carregares baterias antes de entrares na confusão da cidade indiana.
Chickpet (mercado)

Esta é a parte velha da cidade. Centro dos transportes (autocarro e comboios), sede do forte da cidade e local do grande mercado de rua. Por aqui, muita confusão e ruas estreitas. A acompanhar grande parte do percurso, um mercado. Daqueles mercados de rua que nos convida a participar. Eu passeio-me por ele. Apenas mais um entre tantas pessoas que por aqui passam.

Como em tudo na India, somos engolidos. Mas é uma boa sensação. Como uma onda, basta nos deixarmos ir até onde ela tem força para nos levar. A partir daí, estamos uma vez mais por nossa conta. Sem dúvida que este sitio completa a parte mais ampla da cidade. Apesar de interessante, sem este mercado de sons e gostos, Bengalore seria um mais pobre.

Os centros comerciais

Quis estar aqui para... estar. Queria experimentar uma cidade indiana. Moderna e actual. Bengalore, cidade que viu crescer um dos co-fundadores do Hotmail, é hoje uma cidade em crescimento. Acabei por ir onde as pessoas passam parte do seu tempo: nos centros comerciais. Um pouco por todo o lado, é aqui que cidade se movimenta.

E o improvável acaba por acontecer quando se quer conhecer uma cidade. Eu, que não sou dado a centro comerciais, acabo por passar algum tempo neles. Pouco diferem do que estamos habituados. Imagem perfeita do mundo actual que vivemos, com todos os seus lados negativos e positivos. Por aqui passeia-se a cidade que vive. Compra-se roupas e presentes de Natal. Ou então passa-se o tempo a ir ao cinema. Foi o que optei. Não tendo uma escolha variada (quero ver um filme de bollywood em Mumbai), acabo por ir ver o Missão Impossível. Um grande sucesso, com as sessões quase sempre esgotadas. Lá consigo o bilhete e sigo para a sala. Mas afinal existem diferenças. Descubro que não posso entrar com tabaco ou isqueiro. Aliviado dessa carga, entro para uma sala escura onde muitos aguardam o início do filme. Lá dentro a pequena confusão indiana. Por esta altura também já é minha. E quando à nossa frente o documento do governo atesta a autorização para o nosso filme começar, o silêncio impera. Apenas cortado pelo som das pipocas.

Bengalore não é um encanto. Se analisarmos por si só cada um dos seus aspectos, existirão outros locais na India onde encontraremos melhor. Mas Bengalore é Bengalore. É o conjunto de uma cidade ampla, indiana, confusa, comercial e muito dinâmica. É esta rede de pormenores tão diferentes que acabam por marcar esta cidade. E enquanto saboreio o meu expresso num daqueles cafés modernos, penso: já fui “Bengalorizado”...

Wednesday, January 4, 2012

Le Moi Errant: O tempo


Quando pensamos em viajar, pensamos em locais físicos. Foi assim comigo. Enquanto preparava este sonho, colocava-me em algum local distante a observar um pôr-de-sol, ou simplesmente a caminhar numa rua qualquer deste mundo. Assim, o onde era o grande presente que estava a oferecer a mim próprio. E a viagem era, acima de tudo, algo geográfico.

Também seria uma jornada emocional – daí a existência desta crónica – mas não tinha entendido que isso, locais ou emoções, não é a base de uma viagem. A sua essência é o tempo. O que estava a oferecer-me era tempo livre. E nos dias de hoje, tal é precioso. É o que torna uma viagem em algo especial. Antes de partir tinha uma relação esquizofrenica com o tempo. Sentia-o precioso e fugídio. Ora o amava, ora o odiava. Hoje, percebo que ele está ao nosso alcance e no nosso controlo. E que isso - ter tempo - é algo que modifica tudo à tua volta.

A vida é feita de escolhas. A minha guiar-me-á para um destino bem diferente do que chegaria caso tivesse tirado um ano para estar em Portugal. As pessoas que conhecemos, as paisagens que admiramos e as experiências que temos são a fonte da nossa mudança. Mas na essência, estaria também numa viagem, tão mágica e especial como a que estou.

Poderão questionar se vale a pena todo o sacrificio. De caras, respondo que sim. Nem preciso de tirar os olhos do ecrã. Basta ouvir os sons à minha volta, sentir os cheiros das flores que decoram as árvores, ou relembrar todos os optimos momentos e pessoas que encontrei pelo caminho. Mas mais do que viajar, isso é viver... e viver vale sempre o sacrifício necessário para o fazer.

Tuesday, January 3, 2012

História de uma foto: uma árvore



Pode ser apenas uma árvore, mas para mim foi mais que isso. Era alguém que me saudava de manhã. Que me dizia adeus antes de entrar para o hotel, e que de certa forma me acompanhou nesta aventura de 3 dias em Bengalore. Assim como acompanha quem passa nesta estrada (Mahatma Ghandi Road – uma larga e longa avenida pivot da vida em Bengalore) para ir para o seu trabalho. Que dia após dia, aguenta a sinfonia de buzinas que compõe qualquer estrada indiana. Companheira também dos que, um pouco mais à frente, param para beber um chá ou comer o pequeno almoço antes de pegar no rickshaw e procurar o seu sustento.

Gosto de árvores. Para mim sempre as imaginei como nossos guardiões. Trazem vida nos seus ramos, conforto nas suas sombras. São uma lembrança de que pertencemos à natureza e dela dependemos. Talvez por isso gostei tanto desta árvore. Não tanto pela beleza, mas pelo conforto que me deu naquela madrugada em que encontrei a cidade despida de pessoas. Tudo o resto era ainda elemento estranho a tentar entrar no meu mundo. Esta árvore, pelo contrário, já fazia parte do meu. E lá estava ela, a sorrir para mim, e a dizer: “Bem-vindo a Bengalore, meu caro estranho...”

Monday, January 2, 2012

A voar até Bengalore...


E mal coloquei o pé dentro do autocarro, lá estava ele. Gritava por mim, algo que demorei a perceber. Quando me virei tinha o condutor de rickshaw que me “saudou” à chegada a Hampi.

“Remember me?” pergunta-me a sorrir. Como me pudesse esquecer. Depois dessa chegada, ainda tive de dizer mais umas vezes não. Nada que ele não aceitasse desportivamente.
“Of course yes. I'm leaving...” digo-lhe retribuindo o sorriso
“You didn't gave me any bussiness, m'n!”
“I told you... your were wasting your time... and money...” despedimo-nos em sorriso de “adversários” com vontades contrárias.

E com isto terminava a minha aventura em Hampi. Dirigia-me agora para Hospet, a cidade de transbordo desta região. Daí apanharia o autocarro para a minha primeira grande cidade indiana – Bengalore. Antes, mais uma boa conversa com outra viajante – Selina – e o reencontro momentâneo com Oscar. O encanto de Hampi, e a supervisão de Ganesha, ainda perduravam.

Passado umas horas lá chegava o autocarro... para meu alívio. Já passava mais de 30 minutos da hora prevista. Desta vez não existiu nenhum pedido de dinheiro ou pessoa adicional. Tudo bem simples. Simples demais. Lugar visto – desta vez em cima – bem acomodado, e lá começamos mais uma viagem. O espaço não é amplo, mas é o suficiente para uma pessoa dormir à vontade. Tenho apenas uma cortina, e duas barras de ferro, a separar-me do corredor. Por esta altura era ainda um pequeno pormenor.

Contemplo a paisagem. A floresta indiana ganha contornos mistiscos à luz da lua. Facilmente conseguimos perceber o motivo desta região ser tão rica em histórias. Tudo à nossa volta puxa a nossa imaginação e o misticismo. O cansaço entretanto vai-se instalando e acomodo-me. Quando estava naquele mundo entre o sonho e o real... uiiiiiiiiiiiiiii... plash. O desafio da gravidade estava ultrapassado. É uma sensação estranha quando o chão foge debaixo dos nossos pés... Bem, neste caso, corpo.

E o que era um pequeno pormenor – estar apenas resguardado do corredor por duas barras de ferro e uma cortina - passa agora a ser algo bem presente na minha mente.Altura de ajustar a posição do corpo para garantir que não seria disparado para o chão.

A viagem continuou com mais uns quantos desafios à gravidade. Uma vez mais, e a custo de alguns amortecedores, chegamos mais cedo que o previsto, antes do sol nascer. E assim, meio a dormir, tenho a primeira impressão da cidade. Tudo está calmo por esta altura – excepção feita aos condutores de rickshaw. Com a experiência de Hampi ainda em mente, sei que tenho cerca de 10 minutos até ficar uma vez mais sozinho. No entanto, é tempo suficiente para me afastar, comprar tabaco e apanhar o rickshaw que me levaria ao hotel nesta cidade que agora acordava...

Sunday, January 1, 2012

Qualquer coisa chamada de compromisso


Vou cometer o erro mais comum ao ser humano: fazer um compromisso. Na realidade não é bem um compromisso, mais um processo de intenções. A ideia é tentar melhorar um pouco o blogue e dar-lhe alguma consistência. Como em qualquer coisa que faça, quero deixar o alerta que o futuro poderá provar que este foi mais um post sem sentido.

O compromisso passa por colocar um post novo todos os dias utéis da semana. Dou-vos tréguas ao fim-de-semana e feriados. A ideia é criar um ritmo mais certo e previsível. Tal como a viagem, também isto está limitado pelos imprevistos sendo que fica dependente da disponibilidade de internet.

Com o tempo quero também afinar o blogue. Para além de uma possível reformulação gráfica ao longo do mês de Janeiro, vou construir algumas rúbricas temáticas. Assim, para além de textos livres, poderão contar com:

Le Moi Errant – Este não precisa de explicação. A narrativa da minha viagem interior vai continuar e em princípio encontrará o seu espaço às quintas-feiras.

Crónica de Viagem – No fundo é a criacção de espaço para um tipo de artigos que já tenho escrito. Aqui fica as minhas impressões dos locais por onde passei e é onde vou tentar afinar a minha escrita de viajante. Ainda não decidi se o espaço será semanal (e nesse caso escolherei a Sexta-feira) ou se seguirá o ritmo da viagem. Ao longo deste mês verei qual a melhor opção e as vossas sugestões são mais que bem-vindas.

História de uma foto – Este é o novo espaço que criei. Por cada local que passei, vou escolher uma foto que me tenha dito algo de especial. O texto poderá passar pela descrição da foto, pela explicação do momento ou pela criação de uma pequena narrativa à volta da mesma. A ideia é dar uma outra profundidade à fotografia escolhida e tentar-vos transportar para o momento em que a realidade ficou congelada. Tal como a rúbrica anterior, também ainda não decidi se terá um dia próprio (e nesse caso será às quartas) ou se seguirá o percurso da viagem.

Para já, sinto que a tendência será a de criar rubricas temáticas para cada dia da semana. No entanto será Janeiro a provar se isso se concretizará ou não. Fica o compromisso de tentar criar algo novo com mais frequência e, acima de tudo, tentar transformar este espaço no navio perfeito para vos transportar nesta viagem.

P.S. Embora não tenha mencionado, também quero encontrar uma forma de resolver o problema de colocar fotos nos artigos. Ultimamente não tenho colocado, pois a rede é muito lenta. Enquanto não resolvo, não se esqueçam que podem aceder às mesmas pelos links que estão no topo do blogue.

Feliz 2012


Cá estamos todos. Depois de muitos festejos, desejos e votos, um novo dia sorri para nós. Para mim foi uma passagem especial. Fiz o que me apeteceu, num sitio improvável e com pessoas simpáticas à minha volta.

Tornou-se extraordinária pelas mensagens que recebi. Estas tocaram bem dentro do meu coração. Mais que tudo, foram elas que transformaram esta passagem em algo único. Não sei como agradecer, pelo que o faço da única maneira que conheço: muito, mas mesmo muito obrigado!

Agora temos mais 366 dias até completar outro. E antes de começar os festejos do fim do próximo ano, temos uma vida para preencher. A minha vai passar por aqui. Vou tentar ao máximo transportar-vos para o mundo onde vivo, que também é o vosso. Um mundo mágico e encantador. E enquanto estiverem por cá, espero que possam esquecer todos os tormentos que estão lá fora. Que possam sonhar. E acima de tudo que possam sorrir.

Feliz 2012!!!

P.S. Amanhã sai um artigo sobre o que pretendo fazer com o blogue e a partir de terça retomo o trilho da viagem.