Sunday, February 12, 2012

História de um bilhete de comboio...


“A tão ansiada viagem de comboio está quase!” pensei ao reservar o bilhete online. É impossível falar na India, sem imaginar uma viagem destas. O comboio sempre foi o meu transporte favorito. Não sou o único a gostar. Pelo menos, é um sexto da população mundial a partilhar o mesmo gosto neste país. E como rapidamente verifiquei, os bilhetes de comboio estão esgotados e acabamos numa lista de espera.

Optei sempre pelo bus. Era mais barato e flexível. Como não tenho nada planeado, a liberdade de chegar a uma estação de autocarros, entrar num e ser largado no destino final era apelativa demais para ser ignorada. Mas não queria fazer a transicção entre o Sul e o Norte de autocarro. A distância era perfeita para ir de comboio. Fiz a reserva com duas semanas de antecedência. Tinha 25 pessoas à minha frente. Algo que não me preocupava. Quase sempre obtem-se a confirmação nos últimos dias. Por agora a prioridade era visitar uma cidade apaixonante.

E heis que chega o penúltimo dia. Já estava um pouco nervoso. O maior problema era a incerteza. Não poderia marcar o hotel sem ter a confirmação. Com apenas 8 pessoas por desistir, tinha esperança em obter o bilhete. Nessa noite, e sem nada que pudesse fazer, fui beber um café com alguns amigos de couchsurfing. Decidi aproveitar o momento sem preocupações.

Começo com um sobressalto inicial. Dizem-me que já deveria ter marcado a estadia em Mumbai. Mas, conversa puxa conversa, e já tinha local para dormir por lá, ou, caso não partisse no dia seguinte, também em Chennai. Antes de ir para o hotel, verifico uma última vez o número na lista de espera. Já só faltam cinco. Acredito que vou conseguir.

Chega o dia do veredito. Esperava pela confirmação do bilhete. A listagem final de passageiros ficaria pronta quatro horas antes do arranque do comboio ao meio-dia.

9h00 - o meu estatuto não muda. Ainda tenho cinco pessoas à minha frente. Pior, a listagem ainda não está pronta.
9H30 - o meu estatuto muda para 2. O pior que me podia acontecer. Fico encurralado entre perder o valor do bilhete ou ir a correr para a estação de comboio de forma a não perder o comboio.
9H55 - nada muda. Por esta altura tento encontrar alternativas. No dia anterior soube que existem bilhetes – laklal – de última hora. Uma vez comprados ficam confirmados. O site está com problemas e não consigo inscrever-me para comprar o Laklal ticket.
10H00 - uma nova actualização diz-me que a listagem está a ser preparada. Continuo em número 2. Tudo se decide nestes minutos.
10h10 – o veredicto chega... no ticket for me.

Altura de procurar alternativas. O site da companhia de comboios já está operacional para comprar o Laklal. Formulários preenchidos, comboio encontrado e... Descubro que também têm lista de espera. Não queria um encore, por isso procuro à maneira antiga: através de um agente. O cybercafe onde estava vendia bilhetes de comboio. A comissão que pagaria já não parecia tão cara. No meio da conversa – e com a sorte de uma falha de energia – descubro que o agente faz a compra do bilhete online. E esse era um caminho que já conhecia o desfecho. Mas como estava na India, deixo a possibilidade em aberto. Tento uma ultima alternativa antes que a eletricidade retorne: comprar um bilhete na quota de estrangeiro.

Para isso tinha de ir à estação, e não sabia com o que contar. O Lonely Planet dizia que era eficiente. Mas eu estava na India, e essa expressão tem uma latitude enorme aqui. Depois de encontrar um rickshaw, perco uns minutos a negociar o preço da corrida. Algo que só Deus, Allah ou Ganesha sabem porquê. O que no dia anterior - com todo o tempo do mundo - aceitei sem grande hesitações, hoje era impossível de pagar. Acabou por compensar, pois consegui metade do preço mas com o triplo dos passageiros.

A estação é enorme e degradada. Como eu esperava. Mas tem um feeling que já tinha esquecido. O das viagens. Recuperava a paixão dos comboios, e por esta altura sabia que, custasse o que custasse, a viagem seria de comboio. Uma simples pergunta e recebo a indicação desejada. O local parece uma repartição de finanças semi-clandestina. Nova indicação e estava na sala desejada. Daqui até ter o bilhete na mão – e um sorriso no rosto – foram cinco minutos indianos. Quando saí daquela estação, o mundo deixou de ser o rodopio. Voltava à tranquilidade da minha viagem.

Na realidade nunca a tinha abandonado. Estas preocupações não são preocupações enquanto tiveres possibilidades em aberto. E essas, são tão grandes como a tua imaginação e sorte. E nesta sexta feira 13, ela voltava a sorrir para mim. Entregue pelas mãos de Divya.

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