Thursday, February 16, 2012

Inesquecível


15 de Janeiro. Não esqueçam esta data. Se estiverem pela India passem-na em Mumbai. É altura do Kite Festival. As pessoas celebram-no com papagaios. E foi essa a minha ultima imagem da cidade. Saí ao pôr de sol, e o céu era composto por milhares de papagaios que lutavam para se manter no ar.

Na memória fica a alegria das pessoas – adultos e crianças – a brincar com os seus papagaios. A rota do bus levava-me pelos slums de Mumbai. Nesta cidade, os prédios, ou as zonas mais turisticas, são pequenas ilhas que contrastam com o resto. Constituidas de casas toscas de tijolo ou de zinco, encontramos tanta variedade como a das pessoas que as constroem. Naqueles telhados metálicos e ondulantes, silhuetas de crianças sobressaiam. Gesticulavam para dominar um papagaio, mas parecia uma bela dança coreagrafada. Ali, entre o dia e a noite, não sobressaiam as condições de vida, mas sim a alegria. Demonstrando que nenhuma condição é superior ao sorriso das pessoas.

O mesmo tipo de sorriso que tinha sentido ao entrar para o bus. Fiquei três horas à espera que chegasse. Não me apetecia muito ver esta cidade. E como estava enganado. Nesse tempo, vi mais que acharia ser possível. Fui adoptado pela simpatia dos donos e trabalhadores das agências de viagem da LBS Marg. Uma extensa avenida na zona do aeroporto. “Lojas” pré-fabricadas são o local de sustento de sonhos e familias. Recebo doces e histórias. Descubro quanto ganha uma pessoa e o que significa a palavra "Jolar" (charlatão). Descubro o “rei” dos "Jolars" e os seus companheiros. Mais que tudo, descubro a enorme simpatia e acolhimento das pessoas. Como têm ambições simples e corações generosos. Aprendo que o imprevísivel é o mote de uma viagem como esta.

Tão imprevísivel como o descobrir um condutor de taxis que conhece outros portugueses e fala uma ou duas palavras da nossa língua. Aquele viagem até à agencia de viagens foi o entrar no mundo do meu condutor. Taxista muçulmano, muito simpatico e divertido. Ensina-me o seu modo de vida e a coesão familiar na cultura muçulmana. Pergunta-me sobre a minha viagem enquanto descreve a cidade e a sua vida. De como o seu negócio não é muito bom em dias como este. Fim de semana em que as pessoas vão para a cidade de carro ou transportes públicos. Diz isto, enquanto não sai da mesma faixa por uns 4 quilometros. Mumbai tem avenidas surpreendemente direitas e sem tráfico nesse Domingo. Tenho a impressão que a cidade fez uma pausa para eu aproveita-la no pouco tempo que tinha.

E como estava calma quando cheguei. Ao sair da estação, descubro uma cidade de grandes prédios góticos e amplas avenidas. Com passeios que são... passeios. Encontro turistas que vagueiam pelas atracções e lojas que vão abrindo lentamente. Descubro que é dia de maratona. Uma das razões da ausência de trânsito. Dá-me oportunidade de explorar ao meu ritmo a Avenida Mahatma Ghandi e os seus prédios. Toda esta zona é um local turistico como em qualquer outra cidade do mundo. Apesar de estar na India, Mumbai pertence ao “país” das grandes cidades. As quais fazem parte locais como Paris ou Nova York. E quando chego por fim ao Gate of India, um grande monumento-portal que saúda quem vem do mar, sei que esta cidade será muito diferente do que imaginava. E o que pensava impossível já acontecera: tinha-me adaptado ao ritmo indiano.

Senti isso quando cheguei à estação. Eram 4 da manhã. Mais ou menos a mesma hora quando aterrei na India pela primeira vez. Nesse dia tudo era confusão e esmagador. Tudo me assustava, como qualquer sitio exigente assusta. Agora já não era assim. O conjunto de pessoas, eram simplesmente isso. A zona parecia organizada e nem senti “aperto” quando saí para fumar e era abordado pelos taxistas. Tudo era simples e fácil. A decisão de esperar pelo nascer do sol foi feito com a maior naturalidade. Numa estação própria para esse descanso. Já nem a ratazana que se passeava pelo átrio me incomodava. Até tive pena dela. Estava aleijada numa perna e lá tentava, coxeando, chegar ao seu destino. Talvez este seja uma das grande lições que já apreendi. A do respeito em vez de repulsa. Por todos os seres vivos, mesmo aqueles que antes tanta confusão me faziam.

Não sei se volto a Mumbai. Foi intenso demais para repetir o local em tão pouco tempo. Mas em viagem tudo pode acontecer. Uma estadia de 3 dias, passar a um vislumbre e esse a uma experiência inesquecível.

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