Thursday, May 17, 2012

Luang Nam Tha Trek

Gosto da minha coerência. Volvidos quinze dias desde que descobri que treking não era para mim e aqui estava eu de botas calçadas e mochila nas costas para mais um. Antes de tomar a decisão, enchi a pessoa da agência com perguntas: “é muito difícil?”, “quantas horas a andar?”. “que nível de dificuldade?”. “e a paisagem? Que tipo é?” Ele, com uma paciência própria daqui, respondia-me a todas e apaziguava a minha alma. Na realidade não tinha alternativa. Decidi Luang Nam Tha – uma pequena vila no norte de Laos – por causa do trek, e apenas queria uma confirmação de que não cometera um erro.
Dia 1
O primeiro dia começa no mercado. Enquanto nos passeavamos pelas bancadas de frutas, insectos e outras coisas que não conseguiamos identificar, os nossos guias compravam o almoço. Como qualquer bom mercado, cada passo era preenchido por cheiros e sons que quase nos tocavam fisicamente.
Após este momento de pausa, seguimos numa minivan para o início do trek. Uma estrada de terra que corta as belas montanhas da região. O verde e vermelho são as cores dominantes. Uma floresta, que há muito sonhava visitar, desenvolvia-se à minha frente. A minha idade fez com que crescesse a ver os filmes de guerra do Vietnam. Agora teria a oportunidade de viver o tipo de paisagem que tanto imaginei.
Mas antes tinha um dia de caminhada. Este primeiro serviu para atingir a aldeia onde pernoitavamos. Pelo caminho ficaram as imagens das queimadas, o almoço no meio da floresta e a vista ampla da floresta. Quando chegamos ao destino final, todos tinhamos um sorriso de quem passara um excelente dia.

Aldeia
E a aldeia foi a conquista mais difícil do treking. Apesar dos sorrisos amigáveis, nós eramos uns estranhos que iam passar uma noite ali. Uma simpatia envergonhada como cartão de visita. Por outro lado, a aldeia étnica era uma aldeia “viva”. Cheia de antenas de satélite, motos por baixo da casa e utênsilios modernos.
Mas este início pouco auspecioso tornou-se numa experiência única. Esta era uma aldeia real. Não daquelas onde tudo é mantido para condizer as expetativas dos turistas. O mundo desenvolveu-se e a tecnologia chegou a todo o lado. Aqui, em vez de transformar o modo de vida, fundiu-se com ele. Com o tempo, a vergonha foi diminuindo e desapareceu por completo quando partilhámos uma noite de lua cheia à volta de um mágico pote de lao-lao. Envolvidos pelos risos da boa disposição.

Dia 2
De manhã estavam a avisar: “em breve vamos começar...” As nuvens prometeram e cumpriram. Apenas tivemos tempo suficiente para entrar na selva densa. Um conjunto verde que tudo preenche e luta por cada espaço livre. O trek mal se vê, e esta é uma altura em que ter um guia é a escolha acertada. “coloquem os impermeaveis!” avisa-nos com a antecedência de 5 minutos. Sabedoria de quem conhece o clima como um bom amigo. Mas os impermeáveis pouco podiam fazer. A luta estava perdida desde inicio. Pouco tempo depois eu era um pingo de agua.
Altura de andar e escorregar. Cair e levantar. O castanho da terra cobria tudo, mas a água limpava-lhe o rasto. Percebia quão difícil se torna o terreno nestas condições. Uma luta por equilibrio e por avançar uns metros. Mas a cada descoberto, uma paisagem que nos roubava o folêgo. Era uma experiência completa. Chama-se rainy forest por bom motivo. Existe algo na chuva que a torna ainda mais bela.
Atravessamos um riacho para chegar a um abrigo de bambu. Perdido no meio da floresta. Sitio perfeito para retemperar as energias e almoçar. Por entre pingos, as nossas mãos lançam-se ao sticky rice e acompanhamentos. A raiz de bambu num molho picante fica divinal.
Com a refeição tomada, reparo que parte do meu impermeavel está vermelho. Mmmm... acho que sei o que é e verifico o meu braço para ter a certeza. Nada. Oh... espera... o fim das minhas calças também estão vermelhas. Arregaço-as e... uma gorda sanguessuga passeava-se pelas meias. O guia rapidamente retira-a de mim. Eu sinto-me violado. Bebe o meu sangue e eu nem sinto nada. Nem uma picada para dizer “hey estou aqui e vou-me alimentar um pouco de ti”.
Com isto, inicia-se a segunda etapa do trek: um jogo de fuga às sanguessugas. É impressionante a velocidade com que elas se movimentam e nos assaltam. Mas as adversidades servem para criar um espirito de camaradagem e no final eramos sobreviventes de uma luta desigual.
A última parte do trek foi feito sem chuva, nem sanguessugas. Percorremos um ribeiro até à aldeia. Passamos por locais que pareciam nos levar ao paraíso, tal era a beleza do verde que nos envolvia. Chegados à aldeia os nossos pés pediam liberdade. Largamos as botas encharcadas e calçamos os flip flops.
Mas a chuva ainda tinha feito alguns danos, e a nossa carrinha estava umas centenas de metros mais à frente. Altura de enfrentar o lamaçal. Algo que uns flip-flops de algibeira não aguentaram. Ainda bem. Deram-me assim a oportunidade de saborear com os meus pés o paladar desta terra vermelha...
Gosto da minha coerência. É ela que me transporta para a próxima experiência. Uma decisão só a é, se puder ser contrariada. Fiquei contente que, volvido 15 dias de ter decidido que trekking não era para mim, ali estava eu, com os pés na lama e feliz pelos dois dias que passara a caminhar...

2 comments:

  1. aiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii, sanguessugas!!!!

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  2. lololol elas tb não são assim tão más... apenas são tipo party crashers... aparecem sem convite e sem avisar :D

    bjs
    João

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