Tuesday, December 20, 2011

Bem-vindo à India


Mais valia dizer “Bem-vindo à India”. Em vez de “São 10 rúpias” . Olho espantado para tal pedido. É a primeira vez que alguém me exige dinheiro para colocar as bagagens no porão do autocarro. A minha passividade latina faz contas e acaba por desembolsar o montante. Com essa tarefa cumprida, entro no autocarro e dou início à viagem que me levaria a Hampi.

Lá dentro - e depois de uma tentativa frustrada de encontrar os números dos lugares - pergunto “Qual é o meu lugar?”
“É este!” responde o revisor apontando para um ocupado por um indiano.
“Qual?!” pergunta que era mais um “Ok... é este... mas está lá uma pessoa...”
“Este, este!” E por esta altura já o chateava com a minha insistência. Com muita relutância pede ao homem para sair e eu ocupo o lugar. Deito-me estendido para vincar que este é só para mim. Mal o autocarro arranca, o revisor pergunta-me se uma outra pessoa se pode sentar na beira da cama. O meu primeiro instinto é dizer não, mas não vejo motivo para negar. Para evitar abusos continuo a ocupar o lugar todo.

Quando reparo na situação, acabo por perceber o rídiculo da minha posição. Na realidade, no lugar que ocupo, cabem duas pessoas. O máximo que estou a atingir é deixar outra pessoa numa posição incomoda. Digo-lhe, por gestos, para se sentar mais à vontade. Ele responde com um sorriso de agradecimento e surpresa. Talvez pelo tempo passado em Goa, este tipo de situação já não me chateava.

Passo o resto da viagem a dormir, até que um sonoro “Hampi Bazaar” me desperta. Olho para o relógio incrédulo. Estamos a chegar uma hora mais cedo. O que até podia ser uma boa noticia, não fossem 5 da manhã. E a esta hora a guesthouse ainda estaria fechada.

Mal coloco um pé fora do bus, sou atacado pelos condutores de rickshaw. “Rickshaw! Rickshaw! Rickshaw! Do you want Rickshaw? What do you want?” A esta hora da madrugada ainda é fácil ignora-los e acabo por ficar um pouco no terminal - nome dado a um pedaço de terra batida.

Passado cinco minutos, sou uma vez mais abordado

- “What do you want?”
- “Nothing”

- “What do you want?”
- “Nooothing”

Algumas repetições depois:

- “What do you want?”
- “Sunrise”
- “I got it” Solto um olhar de espanto
- “Yes... yes... I've got it”
- “You've got sunrise?! How do you have sunrise??”
- “I take you to see sunrise...”

E com a curiosidade satisfeita digo-lhe que isso não quero. Só pretendo que o sol nasça para procurar o meu pouso. Decido aguardar perto das barracas de comida que existem por ali.

Tempo suficiente para outro condutor meter conversa. Apresenta-me um cartão com o nome da guesthouse que tinha reservado. Sorrio por dentro a pensar que posso ir já para o meu quarto. Desenvolvo a conversa e aceito ir com ele. Como era perto diz-me que lhe pago o que quiser. Lá me ponho a caminho e 5 segundos depois estou à porta. Ele diz qualquer coisa lá para dentro e insiste que existem outras guesthouses mais baratas e melhores. Entretanto fala também com uma outra mulher que tenta me mostrar a sua casa. Eu agradeço mas explico-lhes que já tinha marcado esta. O condutor insiste e começo a ver o filme. Digo-lhe que fico ali à espera que abra. Palavra é palavra. Chega então a dona da casa, que, depois de conversar com o condutor, me diz que não há quartos sem ar condicionado. Eu explico que tinha reservado com, mas que não me importo de ficar num sem. Ela aumenta o preço que tinha dito ao telefone.

Cansado, decido voltar para o terminal. O condutor pede-me então o dinheiro – algo que por esta hora já esperava – e eu dou-lhe as 10 rupias com a certeza de que seriam as ultimas que recebia de mim. Ofereceu-se outra vez para me levar ao terminal, mas eu já não estava interessado. Chego para encontra-lo vazio de companheiros de viagem. Estou agora sozinho entre os nativos. Decido sentar-me ao lado de uma bancada de comida que abria. 

Peço um chá para passar o tempo. Entretanto os condutores iam e vinham. Sempre perguntando quem eu era, se tinha quarto, qual o meu nome e dando a disponibilidade insistente para eu ir com eles. Decido seguir o exemplo de Buda e não sair do lugar. Explico-lhes isso mesmo, algo que os confunde o suficiente para me deixarem em paz. Com o sol já à vista, decido ir à procura de um quarto. Começo a andar com a certeza de que a paz de Goa ficava para trás e estava quase a entrar numa realidade muito diferente...

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